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Corrupção: Os cargos e o boné alheio
por Anderson Cláudio de Melo Machado
O jogo político tem muitas facetas, a articulação, negociação, construção de acordos. Em princípio nada contra, afinal, na vida em sociedade sempre é preciso buscar entendimentos, parcerias, trabalho conjunto, no mais das vezes, inclusive, a custo de concessões mútuas. Perfeito!
No universo político-eleitoral, a justificativa para os apoios, acordos e parcerias é, invariavelmente, a tal governabilidade, a qual se mostra como requisito indispensável à realização do bem comum. Em nome da futura governabilidade e da, nem sempre real, unidade programática, partidos, grupos políticos, empresariais, outros setores da sociedade unem-se em torno de uma candidatura e, com a vitória, buscam espaço para contribuir na administração, por exemplo. Afinal, a vitória foi obtida em conjunto, a administração deve ser realizada da mesma forma. Se os objetivos são republicanos, ou seja, a utilização/administração dos bens, recursos e serviços públicos em benefício da coletividade, isto faz parte do jogo democrático. As decisões administrativas devem refletir o programa conjunto apresentado ao eleitor, afinal foi nessa aliança que o povo depositou seu voto, foi a ela que confiou o exercício da administração.
Porém, infelizmente, quando todo esse espírito público é traduzido em ações, não esporadicamente perde-se, desvirtua-se completamente, transforma-se numa sangria do erário em busca de recompensas, contrapartidas e agrados pessoais. A disputa por “espaço”, por “portarias”, desce a níveis inimagináveis. As faturas das campanhas são apresentadas, entre outros malfeitos, em forma de indicações pra todo tipo de cargo, desde ministro, presidente ou diretor de autarquia, secretários estaduais e municipais, diretores de escolas, coordenadores, chefes da todo tipo e tudo quanto é coisas, até assessores “especiais” de coisa nenhuma, com salários que vão dos mais “apetitosos” até simples salário-mínimo. Criam-se cargos e mais cargos a fim de se abrigar mais e mais indicados. O fator técnico é total e completamente irrelevado, não passa de engodo na imensa maioria das vezes, o que importa pra ocupar esse ou aquele cargo em comissão é o QI (popularmente conhecido como Quem Indica).
Essa circunstância favorece e até estimula a corrupção, a utilização em benefício pessoal. Os milhares de servidores indicados, salvo honradíssimas exceções, sentem-se vinculados a quem os indicou e não ao serviço público. A gratidão, no mínimo, é expressa pela fidelidade eleitoral, ou seja, quem indica garante o voto, isto pra não falar quando os “favores” são bem maiores.
Além da suposta fidelidade pessoal, esta prática é um desrespeito aos servidores de carreira, concursados, efetivos, aqueles que independentemente de qual seja o governante, tem o dever, em regra cumprido com afinco, de garantir o serviço público.
A forma mais correta de se evitar a esse desvio de finalidade no serviço público, não chega a ser uma novidade, aliás, está previsto na própria Constituição, o preenchimento dos cargos públicos deve ser feito por concurso!
Se os governantes, em todos os níveis, obedecessem a Constituição, especialmente o princípio da eficiência e impessoalidade, reservando a livre nomeação e exoneração, exclusivamente, aos cargos políticos como Ministros e Secretários, presidentes de autarquias e outros pouquíssimos, cuja importância política e estratégica seja notoriamente reconhecida, os recursos economizados poderiam ser utilizados na contratação de mais servidores efetivos e na formação técnica de todos, tudo isto em homenagem à eficiência.
Infelizmente, tal consciência anda longe de nossos administradores públicos, aliás, o tal do QI, tem aumentado sua influência em outros órgãos que, em tese, deveriam ser imunes à influência eleitoral e/ou pessoal, tais como Ministério Público, Judiciário, Tribunais de Contas e tantos outros. Para o pesar de nossa sociedade a impessoalidade é, cada vez mais, exceção e as preferências egoísticas e particulares, regra.
Nesta situação, não basta mudarem as pessoas é preciso mudar o sistema, é preciso fechar as torneiras da corrupção. É fundamental tornar o Poder realmente popular e impedir que o Público, o coletivo sirvam, tão descaradamente, ao interesse particular.
Que ninguém mais possa fazer “bondade” com o boné alheio - do povo!